A bunda, o cérebro e a cerveja!



Mulher objeto em pleno século XXI. É assim que muitos nos vêm, nós, as mulheres. Um objeto que podem fazer o que quiser dele e com ele. Continuamos a assistir mulheres sendo vítimas de vários tipos de violência, alguns chegando ao homicídio destas mulheres. Tal ato costuma receber um nome bonito: crime passional. Ele está perto de nós; não mais distante. E os números crescem ano a ano. As estatísticas provam que a violência aumentou, apesar do endurecimento da lei. O que está acontecendo? Onde está o erro? Como transformar uma cultura de violência em uma cultura de paz? Como conseguir entender que um homem coloque em seu carro seus quatro filhos e deliberadamente se jogue contra outro veículo para morrer e matar aqueles a quem diz que ama?
É difícil entender, justamente porque a sociedade está impregnada de uma cultura violenta, machista, conservadora, que é contraditória por si mesma. Podemos ver isso diariamente em todos os meios de comunicação social, retratando a realidade ou fantasiando a mesma. Podemos ver isso ao nosso lado; ou distante de nós. Podemos reproduzir certos preconceitos, se não prestarmos a atenção devida...
Recentemente, o programa Chegadas e Partidas (GNT) mostrou um casal se despedindo e a moça contou rapidamente sua história: ela vivia uma relação difícil, aparentemente violenta, mas, somente quando percebeu que sua mãe e sua filha corriam risco de morte ela conseguiu romper o relacionamento, acionando para isso a Lei Maria da Penha. Mas para continuar viva, teve que sair da cidade. Nesta partida, ela foi trabalhar em um navio como faxineira. Ainda de acordo com ela, foram os melhores 8 meses da vida dela. Lá ela estava livre (?)!!! E ainda conheceu um colega de trabalho e acabaram se apaixonando. No dia em que o programa foi gravado, era dele que a moça se despedia. Mesmo estando em um navio ela se sentia livre e viva!
A reprodução de certas verdades(?) é tão complicada que ficamos impregnados delas e, às vezes, nem percebemos. O assunto da última quinzena, por exemplo, foi a bunda de uma atriz global. Alguém se preocupou com o cérebro da moça? Não, a bunda era mais importante. Muita gente escreveu sobre isso das mais variadas formas, mas o que mais me incomodou é as pessoas insistirem que nós mulheres somos cruéis umas com as outras, como se isso fosse uma verdade absoluta. A bunda dela pode realmente ser bonita, mas garanto que ela faz parte de uma geração de atrizes que quer ser reconhecida por outros atributos que não seja exclusivamente o físico.
Enquanto mais bundas se aproximam, afinal estamos próximos do carnaval (festa que aliás, adoro!) somos presenteadas com uma campanha de cerveja que ainda que indiretamente incentiva a violência contra as mulheres. São três frases: “Esqueci o 'não' em casa”, “Topo, antes de saber a pergunta”; “Tô na sua, mesmo sem saber qual é a sua”. Não é a primeira vez que isso ocorre. Em 2014, uma empresa do ramo esportivo, lançou camisetas alusivas ao corpo da mulher brasileira para serem usadas durante a copa. Acho que o pessoal do marketing destas empresas anda esquecendo o cérebro em casa, só levando a bunda. Taí a cagada!
Aparentemente, depois da crítica de um coletivo feminista, a empresa de cerveja pode retirar a campanha do ar (a de material esportivo cancelou a venda das camisetas depois da reclamação geral). Mas vamos aguardar, pois, com certeza, a luta ainda será árdua, porque vamos sofrer críticas por levar estas coisas tão a sério. Sério é alguém te obrigar a fazer algo que não deseja; sério é você ser vítima de violência, qualquer que seja ela.
Precisamos pensar mais sobre nossos atos; sobre aquilo que a sociedade coloca como certo ou errado. Aguardo manifestações.

Comentários

Regina disse…
A normalização da violência contra a mulher nos meios de comunicação é tal que muita gente nem percebe que fomentando estes comportamentos está reforçando a imagem de subordinação. Quando se coisifica a mulher para vender qualquer produto (cerveja, perfume, carro) está difundindo a ideia patriarcal de posse sobre um ser subordinado, sempre pronto a servir, no caso, uma “simples mulher”.
Outro dia, um jornal de Franca publicou (08/02) um texto em que fazia dos atributos físicos de uma atriz apologia ao machismo, incluindo na história “engraçada” (!?) o próprio filho. Quer dizer, o pai ensinando o papel de “como deve ser um homem”. Fiquei chocada com as opiniões dos leitores em que aplaudiam o tal “jornalista”. Ele expressava no seu texto machista que a as mulheres (exemplificando com a “sua” mulher) que todas se irritam porque têm inveja ou não sabem apreciar os atributos das outras. Isso é sexismo benevolente, mostrando a luta de seres frágeis com um olhar de superioridade de quem olha e sorri ao falar dessas pobres mulheres indefesas.
Nesse mesmo dia, havia uma manchete falando de crime passional!!!! Essa terminologia além de antiquada serve para encobrir e validar a desculpa do crime de lavar a honra por amor (leia-se posse).
Já está na hora de parar com tanta bobagem e começar a ver a mulher como um ser humano e não como um enfeite na vida de um homem.
É por isso, que se faz necessário continuar com as campanhas de sensibilização e a luta para acabar com a discriminação. No nosso cotidiano, vemos que é muito importante modificar estas pequenas atitudes (micromachismo) para que a luta seja lado a lado e não uma luta contra os homens como gostam de espalhar os menos informados.
Isadora Alves disse…
Sempre adorei suas "sacadas" com as palavras. Gostoso de ler e ótima reflexão, foi justamente por ela que me interessei. A normalização das opressões as vezes nos assusta. Na semana passada fui à Bienal da UNE, e na "esperança" de encontrar pessoas atentas a essas questões, encontrei só machismo, músicas que incentivavam o abuso, estupro. Um evento em sua maioria heteronormativo, branco e conservador. Aguardamos manifestações!

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