Dia internacional da mulher: pausa para reflexões
Soraia Veloso
Docente do curso de Serviço Social da FACIP/UFU (Ituiutaba) - Universidade Federal de Uberlândia - e doutoranda na UNESP/Franca (SP). Autora do presente blog
O 8 de março de 2011 será muito diferente dos anos anteriores, pois pela primeira vez, desde a Proclamação da República, uma mulher governa o Brasil. Dilma Roussef foi eleita presidenta e deixou seu nome registrado na história política deste país. Nos próximos quatro anos será avaliada constantemente e sua gestão pode influenciar direta e indiretamente a contratação de mais mulheres para cargos de comando, saltando das gerências para diretorias e presidências de grandes, médias e pequenas corporações. Qualificação, elas têm de sobra, principalmente no quesito educação, realidade apontada por pesquisas diversas que mostram trabalhadoras mais escolarizadas do que os colegas homens. Infelizmente, parcela desta mesma população feminina ainda continua exercendo atividades informais e precárias. De acordo com dados da Fundação Seade, ligada a Secretaria Estadual de Planejamento e Desenvolvimento Social (SP), a taxa de desemprego total feminina diminuiu pelo sétimo ano consecutivo, passando de 16,2% para 14,7%, entre 2009 e 2010. Em um ano, a população feminina contabilizou 163 mil postos de trabalho, volume suficiente para absorver as 99 mil mulheres que ingressaram na força de trabalho metropolitana e reduzir em 64 mil o contingente de desempregadas. Os dados da Fundação Seade mostram que o bom desempenho está ligado ao aumento da escolaridade que, em dez anos (2000-2010), deu-se em ritmo mais intenso entre as mulheres. O porcentual de pessoas com ensino superior completo na População Economicamente Ativa (PEA) passou de 11,7% para 15,0%. Na PEA feminina, essa proporção já ultrapassou os 17,0%, enquanto na masculina corresponde a 13,0%. Com isso, se em 2000 a maioria da PEA com nível superior era composta por homens (51,3%), em 2010, a vantagem passou a ser das mulheres (53,6%).
No setor calçadista francano, venho observando este movimento desde a década de 1990. As trabalhadoras já em 1993 tinham escolaridade levemente superior ao dos homens, tendência que se repetiu nas pesquisas posteriores em 2002/2003 e 2009/2010. Mas, mesmo assim, o quadro salarial continua apresentando disparidades. Mesmo no exercício de funções iguais, elas continuam recebendo proporcionalmente menos que os colegas homens. Realidade não só registrada no setor calçadista, mas em vários outros. De forma geral, apesar de todas as mudanças da sociedade, o trabalho feminino ainda é tido como complementar ao do homem, pois aos olhos desta mesma sociedade, são eles que têm a obrigação de buscar o sustento familiar fora do lar. É um dos motivos que nos leva a reflexão e que explicaria, inclusive, a escolaridade menor, pois desde cedo os meninos são mais cobrados e acabam abandonando a escola para não virarem “vagabundos”.
As sapateiras entrevistadas, porém, enfrentam todo tipo de discriminações que incluem salários menores, são preteridas no momento das promoções, pois as empresas não têm políticas efetivas e claras de cargos e salários – tudo está na mão da chefia direta que decida quem deve mudar de cargo; não contam com creches para seus filhos, tendo que deixá-los com outras mulheres – e não recebem benefícios, mesmo trabalhando em empresas com mais de 30 mulheres. De forma geral, estão infelizes no exercício deste trabalho, salientando o desejo de o deixarem assim que possível para o exercício de atividades e profissões que não tenham ligação com o setor calçadista. Na avaliação das entrevistadas, o setor calçadista é e sempre foi assim, portanto, não há futuro. Algumas trabalham desde a infância e têm condições plenas de exercitar esta avaliação.
Como mudar esta realidade? Não é muito fácil, pois estamos diante de anos de exclusão social. A colonização do Brasil, o Império e a República não levaram em consideração princípios de cidadania e liberdade (estes vieram tardiamente na Constituição de 1988, então, ainda estamos aprendendo). Até 1988, o país vivenciou a exploração, a desigualdade, a discriminação em todos os níveis, com reflexões no Século XXI. Mesmo assim, é preciso continuar investindo em políticas públicas de qualidade – educação, saúde, geração de renda, habitação, meio ambiente, assistência social, entre outras. As mulheres, do campo e da cidade, precisam ter acesso a estas políticas, pois é um direito que lhes cabe. Se tiverem acesso a financiamentos, por exemplo, podem montar negócios próprios, e garantir, desta forma, uma vida com mais dignidade. As empresas, por sua vez, precisam mudar a maneira com vêm seus funcionários, principalmente as mulheres, pois as novas gerações não querem entrar neste setor e seus pais os incentivam a manter-se longe do setor calçadista. Os empresários costumam afirmar que em Franca falta mão-de-obra qualificada. Não é verdade, os trabalhadores e trabalhadoras do setor calçadista francano são muito bem preparados em duas frentes – pelos anos de experiência, iniciado ainda na infância; e pelo SENAI e outras organizações que oferecem cursos básicos, técnicos e especializações. Só que os trabalhadores, independente do gênero, estão cansados da instabilidade histórica do setor e da abertura e fechamento diário de fábricas; afinal, são sempre os mais prejudicados.
Mas afinal as mulheres têm o que comemorar neste 8 de março? A resposta é sim, as mulheres têm o que comemorar, afinal, as conquistas foram muitas. Mas duas merecem destaque: a lei Maria da Penha que trouxe punição mais forte para combater a violência contra a mulher, e a lei que institui a licença maternidade de 180 dias, ainda que a adesão seja facultativa. O prefeito Sidney Rocha (PSDB), de Franca (SP), figura entre os primeiros a estender o benefício às servidoras da prefeitura. Mas, quantas empresas teriam seguido seus passos?
E para finalizar, o Dia Internacional da Mulher, instituído oficialmente pela Organização das Nações Unidas em 1975, como parte das comemorações da década da mulher (1975-1985),. Em 2011, o tema das Nações Unidas para a data é "Igualdade de acesso à educação, ao treinamento e à ciência e tecnologia - trilha do trabalhodecente para a mulher".São vários pontos para um debate diário sobre as vitórias, as derrotas e os avanços necessários para uma vida digna.
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Politicamente, porém, é preciso avançar. A eleição de Dilma Roussef para o cargo máximo deste país terá significado em longo prazo. Nós, eleitoras, precisamos de mais representantes femininas para as demais instâncias – Congresso Nacional, Senado Federal, Assembléia Legislativa, Câmara de Vereadores, Prefeituras.
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Os estudos feministas perderam Heleieth Saffioti no dia 13 de dezembro de 2010. Professsora, pesquisadora e autoras de livros sobre a situação das mulheres, deixará um grande vazio nas pesquisas científicas sobre gênero. Tive a oportunidade de conhecê-la pessoalmente em um evento em Ribeirão Preto e sua maior característica era a sinceridade – não tinha papas na língua. Seu livro, “Gênero, patriarcado, violência”, de 2004, ganhará uma nova edição ainda em 2011.
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Em virtude do Dia Internacional da Mulher, a Fundação Seade e o Dieese elaboraram o boletim Mulher & Trabalho nº 22, que traz informações sobre o mercado de trabalho feminino na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), em 2010, e análise sobre a inserção das mulheres com escolaridade superior. O documento na íntegra pode ser acesso por meio do site http://www.seade.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1050&Itemid=48
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O corpo de Elisa Samudio continua desaparecido. Não há solução para o caso? Desde então, diversas mulheres já foram mortas pelos ex-companheiros, como se o crime que envolve Elisa fosse um exemplo de impunidade para os envolvidos. Aliás, o homem que espancou uma jovem de Franca, batendo sua cabeça na parede, foi preso ou continua foragido? E o pastor que abusou de crianças?
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Em Ituitaba (MG), foi realizada uma homenagem às mulheres intitulada “As mulheres sem medo do poder”. Organizado pelo Conselho da Condição Feminina, pela Associação de Mulheres de Ituiutaba e pela Câmara Municipal, o evento prestou uma bela homenagem a quatro cidadãs do município que têm em comum a educação e a cultura. Foi um ato com grande significado para todas as famílias que ali se encontravam. Eu e o professor Flander Calixto estivemos no local representando o curso de Serviço Social (FACIP/UFU).
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E por falar no curso de Serviço Social da FACIP/UFU de Ituiutaba começamos nossa segunda turma. Estamos com todas as vagas preenchidas – são 49 mulheres e um homem. A primeira turma tem 32 integrantes, sendo quatro homens. Desde a década de 1930 o curso é predominantemente de público feminino.
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A pesquisa Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado realizada em 2010 pela Fundação Perseu Abramo, por meio de seu Núcleo de Opinião Pública, e em parceria com o SESC, apresenta a evolução do pensamento e do papel das mulheres brasileiras na sociedade. Entre os temas abordados no estudo estão: Percepção de Ser Mulher:Feminismo e Machismo; Divisão Sexual do Trabalho e Tempo Livre; Corpo, Mídia e Sexualidade; Saúde Reprodutiva e Aborto; Violência Doméstica e Democracia, Mulher e Política. A pesquisa pode ser lida na íntegra a partir do site http://www.fpa.org.br/o-que-fazemos/pesquisas-de-opiniao-publica/pesquisas-realizadas/pesquisa-mulheres-brasileiras-nos-es
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CME promove 2º Encontro das Mulheres Empresárias da Região de Franca no dia 29
O Conselho da Mulher Empreendedora (CME) da ACIF promove no dia 29 de março o 2º Encontro da Mulher Empresária de Franca e Região. O evento vem com novidades após a participação de três empresárias do grupo em um encontro da ONU Mulheres em Nova Iorque (EUA) sobre o poder das mulheres nos negócios. O 2º Encontro contará com a participação de Luiza Helena Trajano, presidente do grupo Magazine Luiza; de Junia Puglia, Coordenadora de Programas da ONU Mulheres Brasil e Cone Sul; de Ana Maria Coelho, do Sebrae, e da palestrante Nelma Penteado, a “diva da auto-estima”.
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Há dois meses no cargo de ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, a deputada federal licenciada Iriny Lopes (PT-ES) defende que a Lei Maria da Penha, criada para proteger as mulheres em situação de violência, não seja aplicada para beneficiar homens agredidos por suas companheiras. A íntegra da entrevista pode ser lida no G1 http://g1.globo.com/brasil/noticia/2011/03/aplicar-maria-da-penha-para-proteger-homem-nao-e-adequado-diz-ministra.html
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O novo espaço do Programa Regional da OIT de Gênero e Trabalho Decente para a América Latina e o Caribe reúne informações relevantes sobre o tema da igualdade de gênero, como publicações, estatísticas e links de interesse, e conta com uma seção destinada às publicações da OIT em português. Busca divulgar as ações da OIT na região e no mundo na promoção da igualdade de gênero dentro dos quatro objetivos estratégicos da Organização, que são: promoção dos princípios e direitos fundamentais no trabalho; criação de mais e melhores empregos e igualdade de oportunidades para homens e mulheres; ampliação da proteção social, e fortalecimento do diálogo social e do tripartismo. O site pode ser acessado pelo link http://igenero.oit.org.pe
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